JOÃO OLIVA, UMA FIGURA INESQUECÍVEL

Autor: Hercule Spoladore

Eu ainda era Aprendiz (iniciado em 16.06.1962) e naquele inicio de vida maçônica observava atentamente quem eram os Irmãos com os quais convivia.

Tudo era novidade e queria realmente saber onde eu estava e com quem.

Lembro-me deste tempo com certa mágoa quando eu perguntava para algum mestre a respeito de alguma dúvida que eu tinha sobre a Ordem, aliás, continuo a tê-las até a presente data, pois ainda tenho mais perguntas a fazer que respostas a oferecer, e a resposta aquele chavão hipócrita de sempre: “Você ainda chegará lá”. Só que esta resposta muitos mestres davam para todas as perguntas, mesmo que fosse sobre cultura maçônica, história ou mesmo sobre o grau no qual eu estava colado.

Havia muita política na Loja nesta época, mas também havia muito mais realizações que hoje, quer no campo social, ou mesmo na política profana, onde a representatividade da Regeneração 3ª era muito acentuada.

Em fim somente a vivência acabou me ensinando alguma coisa, mas sei que tenho muito a aprender ainda e sempre.
Hoje os mestres desmitificaram mais a Ordem e respondem com mais objetividade e transparência. Parece que a cultura maçônica, graças a uma plêiade de escritores no último quarto de século XX evoluiu muito.

Realmente existem procedimentos, palavras, sinais ou ritualística de outros graus acima do grau que em que se está colado no momento, que só poderão ser do conhecimento quando o adepto atingir tais graus.

Mas isto não implica se que explique para um Aprendiz o que é Maçonaria.

E notando que ao lado daqueles Irmãos que ostentavam altos graus e faziam proselitismo, ou rompância em Loja por ostentarem graus superiores e na Regeneração 3ª no passado existia muito disso, havia também aqueles Irmãos interessantes, amigos, fraternos apesar de já terem sido contemplados com graus elevados, eram pessoas comuns, iguais, que conversavam com os que estavam iniciando procurando lhes ensinar alguma coisa. Verdadeiros Mestres.

Alguns destes Irmãos eram alegres sempre sorridentes, estavam de bem com vida, de bem com os Irmãos. Não faziam política interna, e notava-se que vinham ás sessões era mesmo para se reunir com Irmãos e amigos e usufruir de uma verdadeira fraternidade.

Lembro-me que alguns Irmãos eram até folclóricos e por esta razão, apesar deles já terem nos deixado e estarem numa loja de plano superior mais próximos ao GADU, sempre nos lembramos deles com saudades talvez maiores que de outros Irmãos que também se foram, mas nos marcaram menos.

Refiro-me a um deles, ao Irmão JOÃO OLIVA, nobre maçom.

Apesar do nome não lembrar em nada o sobrenome de estrangeiro, o JOÃO OLIVA falava com o sotaque do sul do Paraná, exatamente como eles pronunciam as palavras naquela região. Era louro, um típico sulista. Lendo sua ficha, vi que ele nasceu na Transilvânia, hoje pertencente à Romênia. (Transilvânia, na ficção é o local onde nasceu o famoso príncipe Wladislaws Tepes, o vampiro conde Drácula). Interessante que o personagem realmente existiu, sendo um déspota e cruel que mandava empalar seus inimigos. Graças a sua maldade um escritor de ficção o transformou em vampiro.

João Oliva foi iniciado na Regeneração 3ª em 16/06/1951. Depois, transferiu-se para o quadro de obreiros da Loja Londrina. Era comerciante e agricultor. Tinha propriedade em Tamarana, então distrito de Londrina, situada há 50 km da sede.

Passou a morar em Tamarana, numa época em que não havia asfalto e a estrada era uma poeirenta e lamacenta quando chovia. E ele vinha assim mesmo. Ele nunca não usava balandrau, como todos os Irmãos usavam e usam em sessões normais. Vinha sempre de terno preto e uma gravata branca totalmente marrom de poeira. No seu paletó, alem da poeira observa-se uma camada de caspa.

Possivelmente antes de sair do então distrito de Tamarana sempre tomava um golezinho de pinga. Então chegava a Londrina com um discreto hálito etílico característico da aguardente, porem o Irmão estava sempre lúcido contente e normal. Era para tirar a poeira da garganta, dizia. Ele era sempre a mesma pessoa, mesmo quando não provava a chamada pólvora branca. Era contador de “causos”. Conversador.

Alegre, sempre de terno preto, mesmo que fosse verão intenso ou frio sempre contando piadas, sempre relatando como tinha sido a viagem. Nos dias de chuva não tinha como vir porque a estrada tornava-se intransitável e na estiagem a poeira era realmente exagerada, mas pelo menos a “jardineira” ou o carro não tinha perigo de encalhar. Só quem viveu esta época poderá avaliar a informação que estou tentando transmitir.

Certo dia veio a uma sessão, e como sempre chegava um pouco atrasado, pois morava longe, o Venerável inventou de telha-lo.

O JOÃO foi colocado entre-colunas e o Venerável com toda autoridade lhe pergunta:
-De onde vindes meu Irmão?
-A resposta não se fez esperar: “Venho de Tamarana e estava um poeirão danado” Venerável Mestre.

Risos por toda a Loja. O Venerável não gostou muito.

Este era o JOÃO.

Lembro-me com carinho de alguns Irmãos do passado que marcaram minha vida maçônica e me deixaram lembranças perenes. E, sem dúvida o JOÃO OLIVA foi um deles.

Após sua morte, a Família queria colocar seu nome em uma das ruas de Londrina. Falei com o Irmão Nahym Libos, então vereador encarregado na época pela Câmara desta incumbência, mas parece que não deu certo. Pena, ele bem que merecia…